Tempo de leitura: 5 minutos
São cada vez mais os criadores que apostam na milenar técnica de tecelagem manual para enriquecer as suas peças. E os padrões a condizer também estão na moda

Entrar ou sair de Londres, passando pelo Terminal 2 do Aeroporto de Heathrow, um dos mais movimentados do mundo, implica agora contacto direto com as obras de tapeçaria de Vanessa Barragão. A artista têxtil algarvia, nascida em Albufeira há 27 anos, assina uma grande tela, com 12 metros quadrados, onde cabe o mapa-mundo com diferentes ecossistemas. Foram necessárias 520 horas de trabalho para chegar à mistura perfeita de oito quilos de juta e algodão, mais 42 de lã reciclada.
Só depois de se licenciar em Design de Moda na Universidade de Lisboa, Vanessa Barragão percebeu que o que mais lhe interessava era o lado criativo do têxtil, mais do que a moda propriamente dita. Mas ainda fez uma coleção de roupa com tapeçaria como trabalho final de curso, em 2014. Todas as peças para vestir seis modelos, entre vestidos, algumas blusas e um cachecol, foram feitas em lã. Para que tudo fosse produzido de modo mais ecológico, sustentável e slow fashion possível, Vanessa usou apenas as mãos. “As peças de roupa feitas com tapeçaria são mais conceptuais. Servem de inspiração para depois desenvolver a parte mais comercial de uma coleção”, explica a artista têxtil. Para Vanessa Barragão, uma peça com tapeçaria torna-se especial por causa da sua textura. “São vários os materiais que podem ser misturados e combinados, desde lã, algodão, diferentes fios, diferentes cores, diferentes pontos. Isso tudo dá muita textura à peça e enriquece-a.”
Na perspetiva da artista têxtil, com profunda devoção pela arte de entrelaçar fios, “a macrotendência na moda é, sobretudo, ecologia e sustentabilidade, o que leva à procura de técnicas artesanais e ao uso de fibras naturais mais amigas do ambiente. Aí surgem a tapeçaria, o tricô, o croché e o bordado e, isso sim, são as microtendências. É uma forma de as marcas se diferenciarem com um toque exclusivo nas suas peças, sempre com um conceito por detrás. Os consumidores procuram peças que tenham histórias na sua origem.”
Dos fabricantes de couro da Mulberry (empresa de moda de luxo britânica) a Jonathan Anderson, atual diretor criativo da Loewe, que classificou o artesanato como “um antídoto paa a velocidade da média digital”, este é um momento em que a sustentabilidade e a moda lenta são o centro das atenções.
Quanto mais artesanal, melhor
Um pouco por todas as capitais do mundo da moda, os criadores estão a apostar no estilo bayeux chic, criando calças, casacos, malhas, bolsas e até sweatshirts com capuz com um toque de tapeçaria, tão antiga como a civilização egípcia.
Em junho, em Florença, a estilista britânica e diretora criativa da Givenchy, Clare Waight Keller, realizou o seu primeiro desfile de moda masculina para a casa francesa. Os modelos desfilaram na passerelle com casacos de tapeçaria com um padrão floral inspirado nos livros do poeta Charles Baudelaire, Les Fleurs du Mal e Le Spleen de Paris. Também o desfile de moda para homem de Bruno Sialelli, na primeira coleção do designer para a Lanvin, se focava na técnica milenar de tecelagem manual. Inspirada nas viagens da fundadora da casa francesa, Jeanne Lanvin, a coleção incluía malhas intarsianas (técnica de tricô usada para criar padrões com várias cores), com tapeçarias que retratavam paisagens marinhas que Jeanne teria comprado.


Recentemente, também a italiana Gucci concebeu uma mochila de quatro mil euros, feita de tecido jacquard de veludo lurex, em verde, vermelho ou bege, com acabamento em couro castanho, ao estilo exuberante do showman Liberace.
Há dois anos, Katty Xiomara, estilista portuguesa com ascendência venezuelana, também pegou em lã neozelandesa e fio de viscose para fazer uma tapeçaria de oito metros quadrados, com quase 50 quilos. A peça Enamorado, uma representação da música El Toro Enamorado de La Luna, interpretada pelos Gipsy Kings, que falava do amor platónico entre duas forças tão distintas, serviu como tela de fundo para o desfile da coleção de inverno. Os modelos vestiam pequenas capas com tapeçaria aplicada, inspiradas nas jaquetas dos toureiros. Para Katty Xiomara a dificuldade em usar tapeçaria na criação de vestuário centra-se no facto de o volume condicionar a forma como pode ser aplicada, e por isso não é usada de forma massificada.

“É pouco manuseável e moldável, torna-se mais pesada, não pode ser aplicada em grandes quantidades. O facto de a tapeçaria precisar de uma certa grossura e consistência faz com que seja muito mais indicada para a roupa de inverno”, explica. E não há nada mais rico do que a textura que a tapeçaria confere à roupa. “A tapeçaria não é mais nobre do que outras combinações de fios e tecidos, mas podemos fazer o jacquard conseguindo diferentes texturas, diferentes combinações de fio, com maior proporção de volumes. As texturas, tudo em que nós tocamos, mexem muito connosco. Por outro lado, acaba por ter um aspeto mais artesanal. São estes volumes e texturas que dão outro movimento às peças”, conclui.
Matéria retirada do site visao.sapo.pt
Nos dias 4 e 5 de abril acontecerá na sede do Instituto Pindorama, em Nova Friburgo/RJ, o curso de Tecelagem Manual. Confeccione tecidos, tapetes, passadeiras, colchas e muito mais usando fibras vegetais, descarte industrial, fios naturais e outros materiais!
Para maiores informações, clique aqui!